Trilhos Cariocas : pequenas histórias

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cataclism2
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Trilhos Cariocas : pequenas histórias

Mensagem não lida por cataclism2 » 05 Jun 2008, 17:34

Por HGPFilho
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Os Trens Suburbanos do Rio de Janeiro nas Décadas de 50 e 60

Sob o Ponto de Vista de Um Usuário


30 de Abril de 2004 - 150 Anos da Ferrovia no Brasil



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Mapa do Sistema Suburbano do Rio, com destaque para a linha da antiga Rio d'Ouro. Mapa publicado no Catálogo do Centro de Preservação Ferroviária do Rio de Janeiro/Engenho de Dentro/1983/Preserve/RFFSA.


A Cidade do Rio de Janeiro, na condição de antiga Capital da República, foi privilegiada na implementação de projetos de construção de linhas férreas desde os tempos do Império, dispondo, já no último quartel do século XIX, de quatro ferrovias. Embora mais antiga do que as suas coirmãs cariocas, focalizaremos a Central do Brasil por último, face à sua importância.



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Foto de usuários do sistema de trens do Rio. Vemos aqui uma ordem exemplar, pois a foto deve ter sido tirada em horário de baixo movimento. Já em horários de pico, o aperto era grande. Foto esta, tomada muito provavelmente em linhas de bitola métrica, das antigas Rio d'Ouro, Leopoldina ou Linha Auxiliar. Foto publicada no Site da Sectran-RJ.

Rio d’Ouro – Criada em 1876, era, inicialmente, uma ferrovia cargueira que tinha por objetivo transportar o material e os operários empregados nas obras de construção das adutoras para o abastecimento de água para a cidade do Rio de Janeiro, desde os mananciais da Serra do Tinguá, na Baixada Fluminense. Compunha-se, inicialmente, de dois ramais: um deles partia da extinta Praia Pequena, no Caju, e os seus trilhos iam até Triagem, de onde seguiam para o destino final; o outro, saía do Porto de Maria Angu, que existia na Penha, e seguia até o encontro com a sua linha principal, em Vicente de Carvalho, nome de um antigo fazendeiro local, embora comumente confundido com o juiz e poeta paulista Vicente de Carvalho.

Apenas em 1883, em caráter provisório, é que os primeiros trens de passageiros começaram a circular, partindo do Caju em direção à represa Rio d’Ouro. Em 1896, passaram a circular com melhor regularidade, até a Pavuna.

Em sua melhor fase, a Rio d’Ouro servia diversos subúrbios do Rio, como o Engenho da Rainha, Inhaúma, Irajá, os já citados Vicente de Carvalho e Pavuna, além de diversas localidades da Baixada Fluminense, como Belford Roxo, Areia Branca, etc.

Com a desativação de suas linhas, ocorrida no começo da década de 70, a maior parte do seu leito foi utilizada para a implantação da Linha 2 do Metrô que, gradativamente, foi se expandindo até atingir, em 1998, a sua atual estação final, Pavuna, e em cujo percurso existem, entre outras, as estações de Del Castilho, Inhaúma, Engenho da Rainha, Vicente de Carvalho, Irajá, Colégio e Coelho Neto.

Leopoldina - Em 1886, a Northern Railway inaugurou um percurso entre a estação de São Francisco Xavier e Duque de Caxias, então denominada Mirity, interligando diversos núcleos urbanos na região que, com o advento da ferrovia, experimentaram um grande surto de progresso. A The Leopoldina Railway Company só começou a operar na área urbana do Rio de Janeiro a partir de 1898 ao incorporar o acervo da Northern Railway que havia falido. Com a expansão da ferrovia, a empresa mandou construir uma estação de passageiros à altura do seu prestígio, a qual foi inaugurada no dia 6 de Novembro de 1926, com o nome de Barão de Mauá. Hoje, o imponente edifício está praticamente abandonado. Há, em estudo, um projeto para a sua transformação num centro cultural, interligado a um moderno shopping center.





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Estação Barão de Mauá, da antiga Estrada de Ferro Leopoldina. Acima termos vista da Avenida Francisco Bicalho. Abaixo, temos vista da região das plataformas. Conta-nos Raimundo Macedo: "A Leopoldina, cuja estação inicial, a majestosa Barão de Mauá, fervilhava de passageiros em décadas passadas, hoje encontra-se praticamente abandonada; nenhuma linha parte mais de sua gare. Apenas os pavimentos superiores são ocupados por algumas repartições públicas." Fotos publicadas na Revista Ferroviária, 1965. Cortesia: Christoffer R.


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No Município do Rio de Janeiro, a Leopoldina servia os subúrbios de Bonsucesso, Ramos, Olaria, Penha, Brás de Pina, Cordovil, Parada de Lucas, Vigário Geral, bem como a cidade de Duque de Caxias e várias outras localidades da Baixada Fluminense.


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Em 23 de Julho de 1971, finalmente os trens elétricos chegaram a Duque de Caxias, região da antiga Leopoldina. Com isso, finalmente estavam realmente unificados os Subúrbios da Leopoldina e da Central, ambos em bitola 1,60m. Posteriormente a Eletrificação foi a Gramacho e finalmente a Saracuna, com a bitola de 1,60m. Os trens elétricos que saíam de Barão de Mauá rumo a Gramacho/Saracuna, foram transferidos para a Estação D. Pedro II, concentrando assim, todas as linhas Suburbanas. Foto publicada na Revista REFESA, década de 70. Cortesia: Christoffer R.



Linha Auxiliar - Em 1893, foi inaugurada a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil, criada pela empresa de mesmo nome, cujo percurso tinha início na estação de Mangueira – razão pela qual a famosa escola de samba é chamada de Estação Primeira de Mangueira – e se estendia até a Pavuna. Posteriormente, a sua estação inicial passou a ser a de Francisco Sá, hoje extinta, nas proximidades da Praça da Bandeira, e a última em São Mateus. Em 1903, a empresa foi incorporada à Central do Brasil, com o nome de Linha Auxiliar.



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Bela foto de D. Pedro II ao cair da tarde. Foto: (?)

Atualmente, os seus trens partem da Estação D. Pedro II e atendem, entre outros, os subúrbios de Jacarezinho, Del Castilho, Rocha Miranda, Honório Gurgel, Pavuna, estendendo-se até a sua estação final em Belford Roxo, na Baixada Fluminense.

Central do Brasil - As duas primeiras ferrovias a serem construídas no Brasil foram, respectivamente, a que ligava a Praia da Estrela, no fundo da Baía de Guanabara, à Raiz da Serra, com 15 km de extensão, por iniciativa de Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, e a que interligava o Recife à Estação da Água Preta, em Pernambuco, com 27 km.

A terceira foi a nossa conhecida Central do Brasil, inicialmente denominada D. Pedro II. A sua inauguração aconteceu no dia 29 de Março de 1858, numa extensão de 48,210 km, partindo da Estação da Côrte - chamada de Campo - localizada no mesmo local onde hoje se ergue o ainda imponente edifício da Estação D. Pedro II, no Campo da Aclamação (denominação que o Campo de Santana recebeu em 1822 e que perdurou durante um certo período da história, por ter sido o palco da aclamação de D. Pedro I como Imperador Constitucional do Brasil) até Queimados. Além das estações de início e fim da linha (Côrte e Queimados respectivamente), havia quatro intermediárias: Engenho Novo, Cascadura, Sapopemba (atual Deodoro) e Maxambomba (atual Nova Iguaçu).

O transporte suburbano, porém, só começou três anos depois, ao ser inaugurada uma linha entre a estação inicial e Cascadura e que contava com apenas um trem diário, que partia às 17:15h e retornava duas horas depois, com uma só parada intermediária, no Engenho Novo, razão pela qual, naquela época, esse bairro ficou sendo considerado como o marco inicial dos subúrbios.

O advento da ferrovia proporcionou um forte surto de progresso à região e a cidade foi se expandindo; outras estações foram sendo construídas ao longo da linha para servirem aos arrabaldes já existentes, assim como a outros que surgiram com o decorrer do tempo e que passaram a ser conhecidos como os “subúrbios da D. Pedro II” e, mais tarde, “da Central”. Por analogia, as localidades à margem das demais ferrovias do Rio passaram, também, a ser chamadas de subúrbio. O transporte ferroviário tornou-se, então, no principal fator de desenvolvimento e integração das áreas suburbanas à vida da cidade.

Com a proclamação da República, a denominação da ferrovia mudou para Estrada de Ferro Central do Brasil.

Hoje, relegados a um papel secundário devido à incúria das autoridades governamentais ao longo do tempo, os trens já se constituíram no principal meio de transportes de massas no Rio de Janeiro. Eram pontuais e freqüentes , chegando às estações em pequenos intervalos de tempo. Em meados da década de 80, chegaram a transportar mais de 1 milhão de pessoas diariamente. Hoje este valor se reduziu a somente um terço disso, com cerca de 320 mil passageiros diários.


ImagemPlataformas de D. Pedro II. Conta-nos Raimundo Macedo: "Esta foto me é muito familiar, é uma das plataformas da Central onde, quando garoto, fiz algumas loucuras. Havia plataformas de embarque e de desembarque. Assim, nas horas do rush, quando o trem estava se aproximando da estação, muitos saltavam nos trilhos para pular na plataforma de desembarque e, dessa forma, conseguir um lugar sentado. E eu ia nessa. Outros, mal o trem parava, entravam pela janela." Foto publicada no Site da Sectran-RJ.


Nas décadas de 50 e 60, várias eram as linhas que ligavam os subúrbios e localidades da Baixada Fluminense ao Centro da Cidade, através da Estação D. Pedro II, a saber:

Imagem: Interligava a Estação D. Pedro II à do Engenho de Dentro e era um "trem parador", assim chamado porque parava em todas as estações do trajeto, a saber: Lauro Muller (Praça da Bandeira), São Cristóvão, Mangueira, São Francisco Xavier, Rocha, Riachuelo, Sampaio, Engenho Novo, Méier, Todos os Santos e Engenho de Dentro. Se a memória não me trai, esta foi a primeira das linhas suburbanas a ser extinta, passando as suas paradas a serem servidas pelos trens da Linha 12 – Madureira.

Linha 12 – Madureira: Ligava D. Pedro II à terra do samba, Madureira. Era também um “trem parador”, cujas estações atendidas eram as de Lauro Muller (Praça da Bandeira), São Cristóvão, Mangueira, São Francisco Xavier, Rocha, Riachuelo, Sampaio, Engenho Novo, Méier, Todos os Santos, Engenho de Dentro, Encantado, Piedade, Quintino Bocaiúva, Cascadura e, por fim, Madureira. Essa linha não mais existe e as suas estações passaram a ser servidas pelos trens da linha de Deodoro.

As estações do Rocha, Todos os Santos e Encantado, citadas nos dois últimos parágrafos, foram desativadas.

Partindo de Madureira para a Cidade havia, também, o trem apelidado pelo povo de “Marta Rocha” que, ao que nos lembramos, fazia apenas uma parada, na estação do Engenho de Dentro. O preço da passagem do “Marta Rocha” era mais caro e nele só viajavam os mais abastados, a chamada “elite suburbana”. Trem cheirando a novo com muitos passageiros de nariz empinado por viajar em tão seleto meio de transporte. Havia um fiscal, furando com torniquete os bilhetes dos passageiros que eram carimbados e grossos feito cartão, para inibir que o incauto plebeu “furasse” a fiscalização.


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Foto do Agente da Estação Deodoro, publicada na década de 70 na Revista REFESA. Cortesia: Christoffer R.


Linhas 13 e 23 – Deodoro: Se não me falha a memória, havia em Deodoro, inicialmente, apenas uma linha final de trem, a 13; mais tarde, foi criada a 23. Ambas faziam o mesmo itinerário: a 13 tornou-se um “trem parador” com a extinção da Linha 12 – Madureira. Os seus trens partiam da gare Pedro II e paravam em todas as estações até chegar à parada final, ou seja, naquelas anteriormente servidas pela Linha 12 e nas que se seguiam a Madureira: Osvaldo Cruz, Bento Ribeiro, Marechal Hermes e, por fim, Deodoro.

A Linha 23, por seu turno, parava num número menor de estações. Saía de D. Pedro II e parava, apenas, em Lauro Muller (Praça da Bandeira), São Francisco Xavier, Méier, Engenho de Dentro, Cascadura e, daí em diante, nas mesmas estações da Linha 13. Era quase, um “trem direto”.

De início, os trens diretos não paravam na estação de São Francisco Xavier, só o fazendo anos depois.

Segundo informações obtidas, os trens que partem de Deodoro em direção ao Centro da cidade, atualmente, param em todas as estações do trajeto; os chamados “trens diretos”, por seu turno, em determinados horários de pouco movimento, atuam, também, como “trem parador”.

Deodoro era – e continua a ser – o ponto de bifurcação da ferrovia: uma das linhas segue para a Zona Oeste, antiga Zona Rural, e a outra, para a Baixada Fluminense. Os trens dessas linhas eram denominados “trens diretos” porque paravam em poucas das estações servidas pelos trens de Madureira e de Deodoro.


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Estação de Deodoro, antes da eletrificação dos subúrbios da Central do Brasil, mais precisamente em agosto de 1936. Na foto acima à esquerda, podemos ver o início do Ramal de Santa Cruz, na extrema esquerda, na curva que ali se iniciava. A direita, temos a linha tronco. Na foto acima a Esquerda, temos outra vista da Estação Deodoro. Fotos publicadas na Revista Ferroviária, 1965. Cortesia: Christoffer R.



Linhas 41 e 42 – Campo Grande e Matadouro: Destinavam-se à antiga Zona Rural do Rio de Janeiro, eram as linhas do Ramal de Santa Cruz. Os trens da linha 41 saíam da gare de D. Pedro II e seguiam direto até o Engenho de Dentro, daí paravam apenas em Cascadura, Madureira e Deodoro. Depois desta última, paravam em todas as estações intermediárias até o final da linha, a saber: Vila Militar, Magalhães Bastos, Realengo, Padre Miguel, Bangu, Senador Câmara, Santíssimo, Augusto Vasconcelos e, por fim, Campo Grande.

Os da linha 42 faziam o mesmo itinerário até Campo Grande, de onde prosseguiam até a estação do Matadouro, em Santa Cruz. As estações que se seguiam eram a de Inhoaíba, Cosmos, Paciência, Santa Cruz e, por último, Matadouro.





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Trem elétrico da Série 200, com o Maracanã ao fundo. Foto publicada na Revista Ferroviária, ano de 1965. Cortesia: Christoffer R. Estes trens foram fabricados na Inglaterra pela Metropolitan Vickers em 1954, e foram apelidados de "Marta Rocha", Miss Brasil na época.


Linhas 30, 31, 32 e 33 – Eram as linhas do Ramal de Nova Iguaçu. Os trens dessas quatro linhas destinavam-se à atual Baixada Fluminense. A linha N.º 30 fazia a parada final em Nova Iguaçu; a 31, em Queimados; a 32, em Japeri e a 33, em Paracambi (antiga Tairetá). Saíam da estação inicial D. Pedro II, paravam no Engenho de Dentro, Cascadura, Madureira, Deodoro e, daí em diante, em todas as estações do trajeto até atingirem a respectiva parada final. As estações intermediárias eram a de Ricardo de Albuquerque e Anchieta, ainda na Cidade do Rio de Janeiro, e, em outros municípios: Olinda, Nilópolis, Edson Passos, Mesquita, Nova Iguaçu, Queimados, Japeri e Paracambi, além de algumas outras intermediárias entre as citadas.




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Foto de um Série 200 publicada no Site da Sectran-RJ.

Nas horas do rush, os usuários dos chamados “trens diretos”, das linhas de Santa Cruz e de Nova Iguaçu, ficavam irritados quando algum passageiro “apressado”, que dispunha de outras linhas para os seus destinos, pegava o “seu” trem com a intenção de saltar em alguma das estações intermediárias, tornando-o mais cheio. Eles, simplesmente, se espremiam para impedir a saída do incauto passageiro na estação pretendida. Eu mesmo fui vítima desse “castigo”. Lembro-me que, aos 17 anos de idade, na pressa ao voltar para casa, peguei o “direto” 31, de Queimados, na estação D. Pedro II. O trem estava superlotado e, ao chegar a Deodoro e tentar saltar, fui impedido pelos passageiros que diziam: “Vai chupar laranja conosco em Nilópolis!”. Os laranjais, nessa época, predominavam naquelas áreas. Realmente, só consegui saltar em Nilópolis, quarta estação depois de Deodoro. Eram tempos difíceis, porém saudosos!

Nessa fase áurea do transporte ferroviário no Rio, o “Trem das Professoras” ocupou um papel de destaque, tornando-se tema, inclusive, de um famoso samba, cantado e imortalizado na voz de Silvio Caldas: “... e no trem das professoras, entre outras tão sedutoras, eu não vejo mais ninguém”. Na realidade, o chamado “Trem das Professoras” era uma composição que servia, com exclusividade, a militares da Aeronáutica e que partia da Estação D. Pedro II com destino à Base Aérea de Santa Cruz. Ele parava em algumas estações do percurso, entre elas a de Madureira, onde os militares embarcavam.



Devido aos investimentos sempre estarem um passo atrás da verdadeira necessidade do Sistema Suburbano, os trens nem sempre ofereciam a comodidade mínima para os passageiros, tendo estes, que viajar na porta como "pingentes" nos horários mais concorridos. Foto publicada no Site da Sectran-RJ.

A composição tinha seis vagões com quatro portas cada, nas quais se postavam guardas da Corporação com a incumbência de impedir o embarque de pessoas não autorizadas. Havia vagões específicos para oficiais e para soldados. Para agradar e fazer média, além dos militares da Aeronáutica, a única exceção permitida era o embarque de professoras e normalistas do ensino público, daí o apelido do trem.

Havia, ainda, outro trem a serviço da Aeronáutica com o mesmo fim, com destino ao Campo dos Afonsos. Este, ao chegar em Bento Ribeiro, pegava um desvio que conduzia até a Base Aérea.

Em contrapartida ao “Trem das Professoras”, havia outro chamado de “Cacareco”, destinado a transportar soldados do Exército para as estações da Vila Militar e de Realengo.

Havia, numa curva nas proximidades da Estação do Engenho de Dentro, no sentido em direção ao Centro da cidade, o então famoso “poste Bellini”, fincado junto ao muro da ferrovia e rente aos trilhos. Este poste ocasionou diversos acidentes, muitos deles fatais (eu mesmo tive um colega que faleceu, vítima deste poste). Ele era assim apelidado porque era difícil aos pingentes passarem por ele com o trem em movimento, numa referência ao vigoroso zagueiro vascaíno e Capitão da Seleção Brasileira, campeã do Mundo de Futebol em 1958. A força centrífuga descolava os pingentes em direção ao “Bellini” e, ao se aproximar do poste, a turma dependurada do lado de fora gritava: “Olha o Bellini!” e o pessoal se encolhia ao máximo ... Céus!

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Fotos do Viaduto sobre a Avenida Francisco Bicalho, Cidade do Rio de Janeiro. Fotos publicadas na Revista REFESA. Cortesia: Christoffer R.





As linhas disponíveis atualmente são, basicamente, as mesmas das décadas de 50 e 60. Excetuando-se o extinto Ramal da Rio d’Ouro, hoje servido em sua maior parte pela Linha 2 do Metrô, os demais ramais são explorados pela Super Via, a atual concessionária dos trens urbanos do Rio de Janeiro.

Muita coisa mudou desde então. A qualidade do transporte oferecido piorou, em vez de melhorar. Reconhece-se que a atual concessionária tem procurado melhorar a qualidade dos serviços prestados e muita coisa já foi feita. Porém, ainda está muito longe de atingir um nível comparável aos prestados pelo Metrô, um tipo de transporte assemelhado ao ferroviário.

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Mapa recente da Supervia, atual administradora do sistema suburbano do Rio de Janeiro. Clique aqui para ver outro Mapa da Supervia, onde é possível visualizar melhor as Estações de seu sistema.



O PORQUÊ DA CLASSIFICAÇÃO DE SUBÚRBIO


Segundo o Dicionário Aurélio, o vocábulo subúrbio significa “cercanias de cidade ou de outra povoação” e suburbano, “pertencente ou relativo a subúrbio ou que mora em subúrbio”. Este último, porém, apresenta outra conotação depreciativa, “que tem ou revela mau gosto”. Em outras cidades do mundo, como Nova Iorque, o termo é adotado na verdadeira acepção da palavra, seus subúrbios são centros residenciais situados distantes da metrópole e as pessoas que lá residem são, em sua maioria, pertencentes às classes sociais mais elevadas. O Rio de Janeiro é, sem dúvida, a única cidade do mundo em que partes de seu próprio território são classificadas como suburbanas.

Durante séculos, o núcleo da cidade restringia-se ao Centro e, ainda no século XIX, documentos se referiam a outras áreas da cidade como subúrbios, a exemplo de documentação da Santa Casa de Misericórdia ao referir-se à instalação dos primeiros cemitérios públicos “nos subúrbios do Caju e de Botafogo”. A discriminação surgiu com o advento da antiga Estrada de Ferro D. Pedro II, ao inaugurar-se a sua primeira linha entre a estação inicial, a da Côrte, no Campo da Aclamação (um dos antigos nomes do Campo de Santana que, desmembrado, deu origem à atual Praça da República) – onde depois foi erguido o atual edifício da Estação D. Pedro II – e a de Queimados, no dia 29 de Março de 1858, num percurso de 48,21 quilômetros.

O mentor intelectual da construção da mais importante ferrovia do Brasil foi o Dr. Thomas Cochrane, um médico homeopata inglês, sogro do escritor José de Alencar, que, por não ter conseguido o financiamento necessário para a efetivação de seu projeto, vendeu a concessão para um grupo liderado pelo Dr. Cristiano Ottoni, irmão de Teófilo Ottoni.

O transporte suburbano, porém, só começou três anos depois, no dia 16 de Março de 1861, ao ser inaugurada uma linha entre a estação inicial e Cascadura, que contava com apenas um trem diário, assim como de uma só parada intermediária, em Engenho Novo, razão pela qual, naquela época, esse bairro ficou sendo considerado como o marco inicial dos subúrbios. Em seguida, outras paradas foram introduzidas em São Cristóvão e São Francisco Xavier. O advento da ferrovia trouxe progresso à região e outras estações foram sendo construídas ao longo do itinerário para servirem aos arrabaldes já existentes, assim como a outros que surgiriam, e que passaram a ser conhecidos como os “subúrbios da D. Pedro II”, mais tarde, “da Central” – quando a ferrovia passou a denominar-se Estrada de Ferro Central do Brasil (hoje explorada por uma empresa chamada SuperVia). Por analogia, as localidades existentes ao longo das demais ferrovias do Rio foram, também, chamadas de subúrbios.

Se o Engenho Novo era considerado o marco inicial dos subúrbios na segunda metade do século XIX, por ser a única estação de parada dos trens suburbanos, e se adotarmos esse mesmo critério, o ponto de início dos subúrbios retrocede a outras estações construídas posteriormente. Dessa forma, poder-se-iai apontar a Estação de Mangueira como sendo o começo da zona suburbana, ou até mesmo, a da Praça da Bandeira.



Um pouco mais de detalhes dados pelo amigo Raimundo Macedo:

"Estou com 64 anos de idade e sou, de certa forma, um saudosista dos tempos em que nos locomovíamos pelo Rio de Janeiro através de transportes de massa, como os trens e os bondes. Estes últimos passaram a ser extintos no Governo de Carlos Lacerda, a partir de 1961, no antigo Estado da Guanabara, substituídos pelos "trolley buses", de curta duração. A última linha foi desativada em 1967 e resta-nos, hoje, tão somente os bondes de Santa Teresa, porém em precárias condições.

Quanto aos trens suburbanos - classificação com a qual não concordo por considerá-la depreciativa -, comecei a utilizá-los quotidianamente no longínquo ano de 1954 quando transitava entre Madureira e Marechal Hermes, onde freqüentava o antigo Curso Ginasial na Escola Técnica Visconde de Mauá (que, por coincidência, tem o nome do Patrono da Ferrovia no Brasil). Os trens em uso nesta época eram remanescentes de um período em que as passagens eram divididas em 1.ª e 2.ª classes; os de primeira com assentos acolchoados de couro na cor azul e os de segunda, com assentos de madeira.

Na modesta opinião de um leigo que tem testemunhado as mudanças verificadas no Brasil na últimas décadas, a decadência do transporte ferroviário no Brasil começou a partir do Governo de JK, quando foram criados diversos incentivos à indústria automobilística, em detrimento do transporte de massa de passageiros e cargas, prejudicando não apenas o ferroviário, mas também o marítimo. A partir de então, sobretudo nos Governos militares, investiu-se na abertura de rodovias, e as ferrovias ficaram à mingua. O estado da malha ferroviária e do material rodante ficou cada vez mais deteriorado, com manutenção deficiente e sem reposição. Lembro-me de ver, diversas vezes, trens sendo "canibalizados" nas oficinas de Deodoro, cujas peças eram utilizadas para reparar outros que estavam parados."

Raimundo Albuquerque Macedo


COMPLEMENTOS



Para saber mais, você não pode deixar de visitar os seguintes Links:



http://www.efbrasil.eng.br/electro/efcb.html - A Eletrificação das Ferrovias Brasileiras - EFCB, por Antônio Augusto Gorni

http://www.anpf.com.br/histnostrilhos/h ... ro2004.htm - Os Subúrbios Paulistas - I, por Christoffer R.



Este Artigo é obra de Raimundo Albuquerque Macedo, Bacharel em Direito, Funcionário aposentado do Banco do Brasil desde 1994, onde, dos 30 anos de serviço, 21 foram exercidos na área de Informática (na época, chamada de Processamento de Dados). Seu Hobby é ser pesquisador amador de fatos e curiosidades sobre a origem dos bairros da cidade do Rio de Janeiro, onde reside. Para elaborar este texto, contou com a colaboração de dois colegas da época de Ginásio - Gilberto e Attilio - que o ajudaram a recordar alguns fatos que já não estavam muito vivos em sua memória. Embora nunca tenha tido qualquer vínculo empregatício com ferrovias, guarda boas lembranças não apenas do tempo em que andava de trem, mas, também, das peladas que jogava no campo de futebol que havia nas Oficinas da Central do Brasil em Deodoro. Explica ele: "Fizemos o antigo curso ginasial na Escola Técnica Visconde de Mauá, em Marechal Hermes, que ficava muito próxima às oficinas da Central. Diversas vezes, após as aulas, eu e um grupo de colegas nos dirigíamos às oficinas e, com o consentimento dos responsáveis, tínhamos o acesso ao campo de futebol liberado, onde o "racha" corria solto. Bons tempos aqueles....

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Mensagem não lida por cataclism2 » 05 Jun 2008, 17:35

Crédito da mensagem: HGPFilho
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ORIGEM DAS ESTRADAS DE FERRO

Fonte: A Formação das Estradas de Ferro no Rio de Janeiro – O Resgate da sua Memória – Autor: Helio Suevo Rodrigues

Nova página na história mundial dos transportes abriu-se no dia 27 de setembro de 1825, quando uma multidão de ingleses estupefatos, colocados ao longo de uma estrada provida de trilhos de aço, assistia ao acontecimento inédito e espetacular de uma máquina de ferro trafegar quinze quilômetros de Stockton a Darlington, fazendo sua premiére mundial. Algo fantástico e quase inacreditável ver aquele carro de ferro correr sobre trilhos de aço, abrindo imagens perspectivas para as comunicações.

A origem do transporte feita sobre trilhos pode ser contada a partir do século XVI quando na Alsácia e na Europa Central vagões de minério rodavam sobre trilhos de madeira. O uso da tração animal foi uma conseqüência natural para esse meio de transporte, antecipando o pleno uso do transporte ferroviário a partir do final do século XVIII quando a Revolução Industrial na Inglaterra propiciou a descoberta da energia a vapor aplicável a máquinas e logo depois também para o transporte sobre rodas. Em 1804 na Inglaterra surge a primeira locomotiva a vapor do mundo. Alguns dos outros modelos de locomotivas construídas nos primeiros anos do século XIX tiveram uso semelhante ao dos primeiros carros sobre trilho: nas minas inglesas e alemãs.
A primeira ferrovia pública com tração a vapor foi a Companhia Estrada de Ferro Stockton & Darlington inaugurada em 27 de setembro de 1825, sendo projetada e construída por incumbência de alguns donos de minas que procuravam uma maneira barata de transportar seu carvão para o cais. Operário e fiscal de minas de carvão, mais um arguto observador que propriamente um técnico em ciências fiscais (até aos vinte anos não sabia ler e escrever), Stephenson soube condensar todos os elementos até então existentes, gerados de pesquisas notáveis que se iniciaram com Papin e teve seqüência com Oliver Evans, Saguin, James Watt, Hancock, Trevithich, Hedley e outros mais. Certamente desconhecida a teoria de Blakett, que em 1813, demonstrava que o peso de uma máquina e o atrito com os trilhos gerava aderência, teoria essa comprovado por Trevithich anos mais tarde, quando construiu o protótipo de uma locomotiva a que denominou “Blucher”. Era um engenho complicado e que tinha cadeias para movimentar as rodas mas não deu resultados satisfatórios, levando-o em 1815 a construir outra locomotiva com outros aperfeiçoamentos. Na ocasião surgiu outro concorrente de nome Hackwrth, que apresentou sua locomotiva de nome “Royal Gerorge”, na qual substituíra a cadeia sem fim pelo braço conector, permitindo um grande avanço na técnica ferroviária. Mas tudo o que fora feito, até então, não representava ainda um decisivo passo na missão de dar rodas de ferro ao mundo. Foi George stephenson, quem, observando certo dia uma chaleira com água fervente, notou que por ação do vapor a tampa bastante pesada do recipiente era permanentemente movimentada, o que lhe deu a idéia de aproveitar essa energia de modo a movimentar uma máquina sobre trilhos de ferro. Surgiu então a “Locomotion”, que pela primeira vez movimentou um trem, fazendo calar os inimigos do progresso e abrindo perspectivas à indústria e ao comércio. No histórico dia, o mundo pela primeira vez viu uma locomotiva a vapor construída por George Stephenson, movimentar uma composição ferroviária.
Para viagem inaugural, vinte e um veículos, entre carros de passageiros e vagões, formavam a primeira composição tracionada pela “Locomotion” deixaram maravilhadas milhares de pessoas que cercavam o palco de tão extraordinário espetáculo e vibraram quando os diretores e proprietários da Companhia de Estradas de Ferro Stockton & Darlington tomaram lugar especial logo atrás da locomotiva dando sinal para partida. Preparados para levar 300 convidados mais de 500 pessoas conseguiram em meio ao tumulto encontrar um lugar sentado ou em pé nos carros de passageiros. Ao longo da linha, milhares de curiosos testemunhavam o acontecimento que ia entrar para a história como um das mais surpreendentes conquistas da humanidade. Embora a tração na parte montanhosa fosse feita por cabos alimentados por motores a vapor estacionários, o trecho de 20 milhas (36km) era operado por locomotivas (para carga) e por cavalos (para passageiros) foi transposto a uma velocidade de 27 milhas horárias, mas devido as longas paradas nas estações intermediárias durou 7 horas. A linha se tornou um sucesso tanto comercial como técnico, encorajando os comerciantes de Manchester a providenciar sua própria linha para o mar.
O dia 27 de setembro de 1825 abriu um vasto de progresso para o mundo e para George Stephenson e sua “Locomotion” foram reservados lugares de honra na história.
A Liverpool & Manchester Railway é considerada como a precursora da era das ferrovias, pois que trouxe ao conhecimento público as potencialidades do transporte intercidades de tração a vapor sobre trilhos. O projeto de engenharia foi de George Stephenson, e a obra que pode ser qualificada de magnífica, se considerarmos que o célebre engenheiro inglês não teve qualquer predecessor ou instrutor para orientar seus planos e trabalhos. Trabalhar sem precedentes, inovar em tudo, não estão ao alcance de qualquer pessoa. A construção da linha exigiu a resolução de inúmeros problemas dentre os quais vencer o pântano de Chat Moss . Grandes obras de arte, dentre as quais a ponte de Pedra da Rainhill em curva, assentada sobre sólidos pilares de madeira e um grande túnel de 2 km de extensão, na saída de Liverpool. Os patrocinadores da linha eram em sua maioria homens de negócios que desejavam romper o monopólio do canal existente entre Manchester e Liverpool que eles acreditavam estar prejudicando seus negócios. O projeto obviamente encontrou sérias oposições da parte dos interesses do canal e do serviço de diligências, e como acontecera subseqüentemente com muitas ferrovias, essa oposição lograva obstar por muitos meses a aprovação de seus projetos de lei pelo parlamento. Stephenson tinha também que lutar contra aqueles que preferiam operar os trens com tração a cabos, movidos por uma sucessão de motores a vapor estacionários. A insistência de Stephenson, fez com que a direção da estrada de ferro Liverpool-Manchester decidisse abrir um concurso em Reinhill antes de escolher o tipo de locomotiva mais conveniente para a exploração da rede. Na data do concurso, 6 de outubro de 1929, apenas quatro máquinas estavam prontas para participar da competição: uma das condições básicas do concurso ligava-se à velocidade mínima a atingir: 10 milhas por hora transportando 20 toneladas.
Foi a locomotiva "Rocket" (foguete) de George e seu filho Robert Stephenson que triunfou com facilidade, atingindo a velocidade de 22,5 km por hora (em lugar dos 16 km por hora exigidos). Mas seu sistema de expelir fumaça revelou-se ineficiente, e Robert Stephenson foi forçado a diminuir as aberturas de escapamento. Cada 836 kg de água vaporizada por hora (contra 520 kg antes da modificação), a locomotiva pode rebocar 10 toneladas a 26 km por hora, atingindo um máximo de 46,7 km/h, tornando-se o protótipo de todas as locomotivas que foram construídas desde então. A linha com extensão total de 31 milhas (50 km) foi inaugurada pelo representante do rei, o Duque de Willington em 30 de setembro de 1930. Contrariamente às expectativas, o movimento de passageiros veio a se tornar mais importante que o de carga. A velocidade e a modalidade das tarifas dessa nova forma de transporte eram tais que os passageiros, não somente abandonavam as diligências, como um número adicional deles, que de outra forma jamais teriam viajado, afluíam às estações ferroviárias. O sucesso financeiro da linha inspirou novos projetos em outros lugares. Seus promotores aplicavam literalmente as estatísticas dessa linha para fazer projeções de rendas de suas próprias ferrovias ainda em projeto. Torna-se evidente que as ferrovias eram um “bom investimento”.
No verão de 1830, além de Liverpool & Manchester Railway, já haviam sido abertas três outras importantes linhas públicas: uma delas era a curta Canterbury & Whitstable, movida em certo trecho por locomotivas e em outros por cabos, também na Inglaterra. A outra era o primeiro trecho da ferrovia St. Etienne-Lyon na França, cujo engenheiro, Marc Seguin, havia desenhado duas locomotivas a vapor em complemento a tração cavalar. A terceira, foi o primeiro trecho de 21 Km da Baltimore & Ohio Railroad.
Na América Latina, a primeira ferrovia, da Habana a Guines, foi inaugurada em Cuba, em 19 de novembro de 1837. Na América do Sul, as primeiras ferrovias foram inauguradas no Peru e no Chile respectivamente em 1851 e 1852. Observa-se que quando no Peru e Chile criavam-se as primeiras linhas no continente, no Brasil ainda não existia uma ferrovia aberta, mas a discussão sobre a necessidade da implantação desse moderno meio de transporte vinha de pelo menos uns quinze anos antes.
A implantação de ferrovias em nosso país resultou de um conjunto de medidas governamentais que vieram a favorecer a modernização de alguns setores da economia do país, especialmente, o de serviços e o da produção industrial. Dentre essas medidas, destacam-se: o protecionismo alfandegário, as facilidades para importação de maquinaria, a isenção de impostos conferidas à alguns setores industriais e de serviços, a política de emissões, a concessão de créditos e a lei Euzébio de Queiroz que determinou a extinção do tráfico negreiro. É importante ressaltar que este panorama não pode ser dissociado de nossas vinculações, no plano externo com a Inglaterra e dos reflexos da segunda revolução industrial, e, no plano interno, com as nossas características de país agro – exportador.
Tendo em vista os fatos acima relacionados, os Deputados Pereira de Vasconcelos (Minas Gerais), Manuel Paranhos da Silva (Rio Grande do Sul) e José Floriano de Figueiredo Rocha (Bahia) tomaram a iniciativa apresentado à Câmara, na seção de 3 de outubro de 1835, um projeto autorizando o governo a conceder privilegio para construção de uma estrada de ferro ligando a capital do império as das províncias que representavam. Sem despertar interesse e merecer discussões, o projeto transitou rapidamente, nas seções dos dias 10 e 13, sendo aprovada na seção do dia 15 e assinada a Lei pelo Regente Feijó no último dia do mês. O decreto nº. 100 de 31 de outubro de 1835 que o Regente em nome do imperador Sr. D. Pedro II sancionou e mandou executar a resolução da Assembléia Legislativa estabelecendo que o governo fica autorizado a conceder a uma ou mais companhias, que fizerem uma estrada de ferro da capital do Rio de Janeiro para as de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia, carta de privilégio exclusivo por espaço de quarenta anos, para uso de carros de transporte sendo que nos lugares em que a estrada cortar as estradas existentes, ou sobre elas for construída, fica a empresa obrigada a construir outras em tudo iguais as que existiam e dentre as obrigações a preencher: dirigir a estrada pelas cidades e vilas que o governo designar, podendo em tudo o mais lhe dar a direção que melhor lhe parecer, iniciando a estrada no prazo de dois anos, a contar do dia em que concluírem o contrato com o governo e a fazer cada ano, pelo menos cinco léguas de estrada. Era de se presumir que os autores do projeto tivessem em mira unir, com ligações fáceis e rápidas, as várias regiões do império a sua capital. No entanto não se encontram nos anais da Assembléia Legislativa nenhuma exposição de motivos, nem quaisquer considerações sobre a utilidade e o benefício que o caminho de ferro traria ao desenvolvimento do país.
O Decreto do Regente Feijó surgiu quando o caminho de ferro ainda era uma novidade e não havia muita fé na sua utilização e importância. Não só pelo projeto ambicioso de chegar até as províncias tão distantes, mas também pela descrença geral, a autorização caducou. Nos meios governamentais duvidava-se da utilidade desse meio de transporte, pois alguns afirmavam que os trens só teriam carga para transportar um dia no mês, ficando ociosos nos outros dias.
Após longas discussões no Parlamento Brasileiro, a Câmara dos Deputados aprovou e encaminhou ao Senado um projeto do médico homeopata inglês Tomas Cochrane, entusiasta do novo meio de comunicação e transporte garantindo o juro de 5% sobre o capital empregado na construção de estrada de ferro e através do Artigo 1º. do Decreto Legislativo nº 641, de 26 de junho de 1852, autorizou o governo: - a conceder a uma ou mais companhias a construção total ou parcial de um caminho de ferro que, partindo do município da Corte, vá terminar nos pontos das províncias de Minas Gerais e São Paulo, que mais convenientes forem. Esta concessão compreenderá o privilégio do caminho de ferro por um prazo que não excederá a noventa anos, contados da incorporação da companhia, tendo-se em vista o plano e o orçamento da obra projetada, debaixo das condições seguintes:
"O governo estabeleceu logo negociações para a construção desta estrada e por intermédio do ministro Sérgio Teixeira de Macedo foi assinado, em 16 de novembro de 1853, o contrato por uma junta de diretores composta do Barão de Goldsmith, W. Thompsom, membro do parlamento, J. White car, J. Pierco Kenniad, L. Hoslewwod e J. Lang, capitalistas de alta importância e representação na praça de Londres. Foi traçada a direção, estabelecendo-se que deveria começar em um ponto da cidade do Rio de Janeiro ou junto a ela, passar por seu distrito municipal, atravessar a cadeia de montanhas denominada Serra do Mar, descer daí o Vale do Paraíba e, dividindo-se no lugar que parecer mais conveniente, de sua vizinhança, seguir na direção da província de Minas, até a Vila da Paraíba e de São Paulo, até o lugar denominado Cachoeira".
Este decreto conhecido por “Lei de Garantia de Juros” instituiu no parágrafo 60 do artigo 1º: a garantia de juros de 5% sobre o capital empregado na construção de caminhos de ferro; estabeleceu no artigo 2º que os contratos ficariam sujeitos a aprovação da Assembléia Legislativa e no artigo 3º declarou sem efeito a concessão da em 4 de novembro de 1840 (construção da Imperial Companhia de Estrada de Ferro desde o Município da Corte até tocar na província de São Paulo, atravessando a serra em lugar azado, seguindo pelos municípios de Piraí, Barra Mansa, Resende e Campo Belo), mas Cochrane não efetivou seu projeto.
Mas o Brasil em meados do século XIX era o Brasil cafeeiro com a produção concentrada nas províncias fluminense e mineira e a exportação através da capital do império, no porto do Rio de Janeiro. Era natural que os poderosos fazendeiros de café dessa região, ainda adeptos do escravismo, pressionassem o governo para conseguir um meio de transporte mais moderno que aliviasse o café das tropas de mulas, única maneira até então de transportar o café dos centros produtores até os portos do fundo as Baía de Guanabara. No entanto, em sentido contrário, o tropeiro, o dono das tropas de carga, também pressionou para não perder de uma hora para outra o seu exclusivismo no transporte interior-porto e vice-versa.
Mas como esse transporte era feito também por escravos, a falta da entrada deles a partir de 1850 com a Lei Euzébio de Queiroz (proibição do tráfico de escravos) deu mais força aos fazendeiros para reivindicarem uma estrada de ferro.
Pode-se relacionar o surto ferroviário brasileiro na segunda metade do século XIX com as “pressões oriundas do advento do capitalismo no Brasil e do novo papel que a economia brasileira passou a desempenhar no interior da nova divisão internacional do trabalho” (Margarida G. Martins, in “Caminhos da agonia – a Estrada de Ferro Central do Brasil 1908/1940”). O melhor escoamento da produção agrícola, nesse caso o café, levou ao inverso, isto é, transporte dos produtos importados mais rapidamente criando condições para aplicação dos capitais estrangeiros. Internamente esse crescimento de exportações levou a um maior número de atividades econômicas através da criação de novas empresas comerciais, industriais e de serviços, num momento de liberação de capitais, até então aplicados no tráfico e na mão de obra escravista, conforme vimos a partir de 1850. Não apenas o interesse dos fazendeiros de café, mas também dos exportadores e comerciantes localizados no Rio de Janeiro deu o sentido das linhas de ferro, isto é, do centro produtor para o centro exportador, ou seja, da área agrícola produtora de café para a cidade - porto exportador e importador de bens de consumo.
A Lei 641 de 26 de junho de 1852 que estabeleceu as condições de aplicação de capitais no setor e autorizou a construção de estradas de ferro no Brasil veio dar continuidade ao privilégio concedido em 1835 e coincide com a inauguração das ferrovias andinas nos países vizinhos.

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