Essa estação recebeu um trem de passageiros - o Bandeirante (Campinas-Brasília) que operou entre 1981 e 1990. Depois disso nucna mais recebeu um trem de passageiros.
Uma curiosidade
"O primeiro trem para Brasília"
Revista "Manchete", 1968 – Centro-Oeste nº 87 (1º-Fev-1994)
[ Esta matéria foi reproduzida na Revista Ferroviária de Junho-1968. Na apresentação da matéria, o redator da RF justifica a transcrição "para que o caro leitor sinta como a moderna imprensa brasileira encara o transporte ferroviário". O nome do repórter não é citado. ]
A saída estava marcada para as 18h30 da sexta-feira. Todos os convidados deveriam estar pontualmente na gare D. Pedro II, no Rio de Janeiro, porque o trem chegaria a Brasília às 10h da manhã de domingo, com pontualidade britânica. Isso era questão de honra.
Assim, 5 minutos antes da partida, as cabines já estavam ocupadas.
Eram 5 carros: — O primeiro para os militares; o segundo para os jornalistas, cinegrafistas e convidados estrangeiros; no terceiro iam técnicos do Ministério dos Transportes; os outros 2 eram o carro-restaurante e o dos ferroviários.
Quarenta horas de viagem pela frente — todos sentiam-se bandeirantes na viagem pioneira.
Na saída do Rio, quase ninguém prestou atenção aos subúrbios que desfilavam pelas janelas. Era a hora dos conhecimentos, das apresentações e das conversas em tom mais grave. Passa um trem apinhado de gente até o teto. O general Elísio Coutinho faz um comentário lacônico: — "O governo devia proibir isso".
No restaurante, os jornalistas comentavam a pontualidade, devido à qual, um colega ficara no Rio. Também surgiu a primeira crítica: — Só havia homens no trem. Militares e civis começavam a falar da mesma coisa, quando apareceram as duas comissárias, vestidas de azul, usando luvras, sorridentes e simpáticas. Aline e Lúcia (não demorou muito para que todos se apresentassem) teriam de atender aos 40 passageiros durante o jantar, no joguinho de baralho e nas rodas onde se tomava uísque.
Assim, com euforia geral, aconteceu o primeiro atraso: — O jantar ferroviário foi servido num horário fora do comum. Aline e Lúcia respondiam a perguntas — de onde eram, família, ocupações — , quando o trem fez a primeira parada, em Barra do Piraí, RJ. Apenas 1 minuto.
Uma hora depois, havia poucos passageiros no restaurante. Quatro oficiais discutiam sobre a indústria automobilística. Outros encolhiam-se nas poltronas. Às 3h da madrugada, o chefe do trem passa com uma lanterna e anuncia:
— Daqui a ponco chegaremos a São Paulo. É melhor os senhores irem dormir. Ainda faltam 35 horas...
Não havia ninguém interessado na chegada à Estação da Luz, mas muitos grupos conversavam em voz alta. Um pedido de "não cantem alto quando passarem pelo carro dos generais". Despedidas. Então, aparece São Paulo, isto é, entram os jornalistas paulistas, que não sabiam do pedido de silêncio e ingressam no trem cantando, juntamente com o colega carioca que se atrasara no Rio: — "Se eu perdesse essa viagem o Andreazza ficaria zangado, e com razão".
Trem Bandeirante com carros Budd adquiridos da Estrada de Ferro Sorocabana, rebocados pela locomotiva G.12 n° 110. Este trem ligava Campinas à Brasília, sua viagem inaugural ocorreu nos dias 20 e 21 de abril de 1968, contudo a operação comercial teve inicio em 15 de dezembro do mesmo ano. (Foto extraída do calendário comemorativo dos 100 anos da CM - Acervo do Museu da CP - Jundiaí)
http://www.cmef.com.br/
Às 3h45, quem dormia foi acordado. Eram Campinas, o que queria dizer baldeação para o trem da Cia. Mogiana. No futuro, quando os passageiros saírem do Rio para Brasília, terão essa parada obrigatória, trocando a Central pela Mogiana. Os engenheiros reúnem os jornalistas para uma explicação coletiva:
— Os trens da Central trafegam em bitola larga; os de São Paulo para Brasília têm bitola estreita. A ferrovia paulista é menos bitolada que a carioca.
Aquela mudança também provocou o início da viagem propriamente dita. Agora, com 10 carros e quase 70 passageiros, a composição tinha outra ordem. O carro dos militares era o último e o dos jornalistas passou a ser o primeiro. Um camareiro, elegantemente uniformizado, dava os últimos retoques nas cabines.
Ar condicionado, lençóis novos e um cheiro de eucalipto, tudo convidando ao sono. Mas, apesar disso, a maioria insistia em permanecer no restaurante — "para experimentar a da Mogiana". Surgiu um jantar-da-madrugada, com bife, frutas, ovos, leite e queijo servidos em mesas enfeitadas com flores de Campos do Jordão. A direção da empresa também havia embarcado em Campinas. A opção entre o restaurante e o dormitório ficava difícil.
Mas, às 10h da manhã, depois de passar por Jaguariúna, Mogi Mirim, Tambaú, Santos Dumont e São Simão, pouca gente permanecia acordada. O trem rodava em calma, enquanto o chefe José Benjamim falava orgulhoso dos seus 29 anos de ferroviário:
— Para mim, essa viagem é uma espécie de prêmio. Sou responsável por 365 toneladas. Se Deus quiser, vamos chegar em paz.
Lá fora, o interior paulista, com suas plantações de algodão e enormes cafezais, nos quais os trabalhadores acenavam, surpreendidos com a bandeira nacional que ia presa à locomotiva. Todos tinham esquecido, um pouco, o ar pioneiro e ainda estávamos em Ribeirão Preto. O prefeito, o padre, o delegado, crianças com bandeirinhas paulistas e muita gente na estação lembravam aos passageiros que aquela era uma viagem histórica. Eram 11h40 de sábado — hora de almoço.
A cidade de Juçara já estava para trás, quando começaram as entrevistas, no carro-restaurante. Elogios ao trabalho "realizado após a revolução de abril", elogios ao ministro Andreazza — "o mais civil dos militares" — , perguntas sobre a construção da ferrovia e sua utilização futura.
O trecho realmente inaugurado seria de Pires do Rio (GO) a Brasília. Quem explicou foi um coronel que, desde o início da viagem, lia o livro "O Desafio Americano":
— Isso se chama descobrir o Brasil — disse ele —, ligar pontos que nos conduzem à cidade do presidente.
O coronel Fernando Allah, membro da Diretoria de Vias de Transporte, agora conta um pouco da história da estrada:
— Em 1965, o Batalhão Mauá começou o trabalho em Araguari e conseguiu fazer o progresso até aqui. Depois, fizeram-se mais 247 km de ferrovia até Brasília. No total, trabalharam 600 militares e 1.200 civis.
Minas já estava sendo ultrapassada, com o maquinista Nelson Silva sustentando uma velocidade de 80 km/h. Orgulhoso, ele também considerava uma recompensa a sua função naquela viagem, aguardando o momento de receber cumprimentos das autoridades, na hora da chegada. Era o que dizia, quando avistamos Uberlândia (MG), onde o secretário de Transportes de São Paulo aderiu à comitiva, numa parada de 5 minutos, sob o frio mineiro. Um apito, a partida. Agora, a próxima parada seria Brasília.
Todos retornaram ao restaurante, onde um cardápio bem impresso dizia: — "Jantar — Aperitivo — Creme de Mandioquinha — Peru à Califórnia — Arroz Natural — Sobremesa — Café, licores — 20 de Abril de 1968". Estávamos na última etapa e a decisão foi unânime:
— Ninguém vai dormir.
Uma ida ao carro dos militares permite conhecer o esquema de segurança, organizado para evitar qualquer tipo de contratempo no percurso pioneiro. Do Estado de São Paulo até Goiás, mais de 1.200 homens foram mobilizados para guardar as estações por onde passaria o trem 120-120. Nas passagens de nível, um mínimo de 5 soldados, comandados por um sargento, tinham feito revisão 10 minutos antes de ouvir o barulho da máquina se aproximando. Tudo cronometrado. Nos 558 metros de túnel, ninguém passaria, mesmo se fosse funcionário da estrada fazendo revisão — só acompanhado por um policial. E, no próprio trem, um delegado comandava uma equipe que ninguém sabia ao certo de quantos homens era formada. O comissário paulista Antônio Cardoso disse que se tratava de um esquema normal, fazendo questão de esclarecer aos repórteres:
— Não é nada de mais. Essa importância é maior quando sabemos que viajam conosco jornalistas de todo o Brasil.
A eficiência do esquema foi provada duas vezes. A primeira, às 23h30, ainda em território de Minas, quando a máquina sofreu uma pane. Desceram os homens da direção da Mogiana e alguns policiais, para verificar o que houve, junto ao maquinista. Constatou-se que tinha sido apenas uma descarga elétrica, e a viagem prosseguiu imediatamente. A segunda, quando se confirmou que 2 trens — um na frente e outro atrás, com tripulações e materiais especiais — davam cobertura à composição que fazia a primeira viagem Rio — Brasília.
À 1h da madrugada de domingo, numa estaçãozinha de Goiás, podia-se ver que agora eram soldados do Exército que respondiam pela nossa segurança. Eles estavam lá, em forma, olhando os passageiros que acendiam as luzes das cabines para saber o nome da cidade — Roncador. Na estação, o anúncio de uma casa comercial: — "Compre na Casa Revolução, que desde o dia 31 de Março baixou os preços das mercadorias". Depois, o retorno ao sono, às rodas de baralho, ao bate-papo em que a importância de Brasília ganhava preferência como assunto. Muitos diziam que, só atravessando o País por terra, como naquela hora, é que se pode sentir a importância da capital federal.
Pela manhã, após o café, começa a crescer a expectativa. O trem já corria nos trilhos cuja inauguração se fazia naquela viagem. Povo olhando curioso. Conversas sobre índios, diligências, caçadores, onças. Renascia o ar pioneiro, bem-humorado, do instante em que deixávamos a gare D. Pedro II. O mesmo clima quando atingimos a pequena cidade de Ciro Castilho, a 150 km de Brasília, onde já apareciam crianças com bandeirolas. Cada um procura melhorar um pouco a própria aparência. Afinal, a viagem tinha sido descontraída, mas a ocasião devia ser solene.
Malas prontas, máquinas preparadas, cadernetas nas mãos, militares, fotógrafos, repórteres, todos começaram a ficar agitados na altura do quilômetro 20. Muita gente dos dois lados dos trilhos. Gente do povo, endomingada, mulheres com crianças no colo, escolares com bandeirolas, homens que andaram de ônibus, de caminhão e de carro para saudar o primeiro trem, tão esperado por Brasília. Aperto na estação Bernardo Sayão. Começa o foguetório. A banda de música ataca "A Banda". Eram 10h17; o trem chegara no horário.
A locomotiva GM-EMD G.12 nº 120 chega à estação de Bernardo Sayão (Distrito Federal) em 21 de abril de 1968. Foto do acervo de Carlos Alberto Missaglia enviada por Marcello Talamo.
http://www.cmef.com.br/
Propaganda publica na Revista Ferroviária em dez/1970. Na foto há uma locomotiva diesel-elétrica LEW e carros de aço inoxidável BUDD. (Revista do acervo do Museu da CP - Jundiaí)
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